30.7.08

liqüidificador com tripas cheias de amor e vontade de sair do mundo

As cores da parede
O concreto
A rede
A paisagem inútil (útil, caetano ?)
Dirás então já sozinho qual foi teu ganho?
E imundo, e sujo dirás que foi o mundo.
E eu já mudo com a mão em pedaços não saberei de te responder.

o poema sem sentido enche meus olhos e minhas pupilas e minhas pálpebras com palavras belas e difíceis e tão e tão cheias de vida - vida que se espalha pelos meus dedos - amanhã a esta hora estarei em montevidéu cidade cheia de - não, atulhada de vida e sujeira e gente gritando em espanhol uruguayo cantando e dançando em um quarto de hotel - espero que o pessoal do aeroporto aceite meu rg copiado

A cidade que de repente é pobre
Teu doce abraço que de repente me cospe
O gosto na boca como algo que explode a milhares de milhas,
Um pouco de nosso amor,

um jogo de bilhar que envolve eu e você
eu você e o mundo que nos separa - quilômetros e quilômetros de terra pedras cidades e amor
porque PORRA EU SOU JOVEM E TENHO QUE VIVER O MAIS RÁPIDO POSSÍVEL
te amar o mais demoradamente possível
antes que o acontecimento do aquecimento global foda com essa bosta toda
antes que meus olhos se cansem de estar abertos e fechem para sonhar com seus cílios

Seus cílios assim sorrateiros, me olhando certeiros de um mundo tão longe
Tão perto, deserto, de minhas indagações insones
De minha boca implorando para que não me abandones
Implorando para que não me sangres, embora eu sei que partirás

Há tanta coisa entre mim e o Chile que não caberá
No mero ato vão de lhe dizer
Que tudo que cabe entre mim e você, é o amor maior
Que viagem, tempo, momento algum poderá lhe cantar
Paisagem inútil meu amor, só cabemos eu, você e o mar.

partirás quando o amor não couber no coração
embora no coração só exista tripas e sangue
mas tripas cheias de amor
e vontade de sair do mundo
ao menos do mundo que me prende longe
longe de você e de tudo
tudo que me deixa longe
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texto escrito por rennanzudo e gabônico
nenhum dos autores estava bêbado quando da criação deste relato

24.7.08

entre umas e outras a batida o choque o corte a amputação e quem sabe a morte

meu amigo morreu esses dias
amigo de bebedeira que foi atropelado bêbado 23 anos na rodovia fernão dias de madrugada seu corpo foi registrado no iml e alguns amigos iam reconhecer o cadáver mas conseguiram contatar o pai e o irmão antes disso e o pai descobriu a morte do filho no dia que o filho iria ser enterrado, mal deu tempo de passar no dito necrotério e reconhecer p'ra dizer que sim, aquele ali era aquilo mesmo, aquele ali tinha sido 23 anos atrás um espermatozóide em sua bolsa escrotal e isso lhe dava o direito pleno de ser a pessoa que deveria estar ali velando os olhos do morto em seu leito de morte fedido e congelado, mas não nós, nós não poderíamos porque nós afinal de contas só bebíamos com ele que morreu e depois de morto foi alvo de piadas sutis e amigáveis que todos nós usamos para esconder a dor - a dor terrível que se abateu sobre nós de forma tão terrível quanto inédita - nós que somos jovens e não conhecíamos a morte e de repente pudemos tocá-la numa tarde quente, a morte deitada num pedaço de madeira - caixão - completamente coberta de flores escondida no corpo daquele que uma semana atrás - p'ra não dizer alguns dias atrás - estava conosco procurando a galera para se afogar em garrafas de refrigerante barato com corote barato (um drink de dois litros que não custava mais que três ou quatro reais) e essa foi a razão de sua morte - numa dessas noites em que qualquer um de nós poderia estar e talvez realmente estivesse bêbado ele foi pego por um motorista desprevenido ou igualmente bêbado ou incauto ou completamente sem culpa e as rodas de seu carro - um ford ka, um toyota corolla, um chevrolet celta, um honda civic, nunca saberemos -, as rodas de seu carro passaram rudemente por sua perna, a perna que esteve ali o tempo todo junto com nossas pernas andando em busca de diversão, e, ocasionalmente - digo, absolutamente todas as vezes - álcool.
eu e todos nós andamos morrendo esses dias
morrendo o tempo todo para renascermos de novo, morrendo à noite quando botamos nossas cabeças nos travesseiros (de penas de ganso, de espuma sintética, de algodão, de papelão, de papel) e pensamos no dia que se foi e no dia que invariavelmente teremos que enfrentar no dia seguinte a despeito de toda essa encheção de saco que é trabalhar & suar & estudar, um dos dois ou os dois ao mesmo tempo, ou então arranjar briga com alguém ou discutir 0u encontrar alguém que guarda um rancor recíproco de você, ou quem sabe todas essas putarias em geral que a vida inventa a cada dia para nos atormentar - e, claro, a única fuga dessa vida miserável - digo, miserável, porque não temos nossa casa ou nossos apartamentos ou nossos carros ou nossas namoradas ou nosso sexo -, a última tentativa de fugir disso tudo era sair como nós saímos ou como meu falecido amigo saiu, mas nunca pensamos que essa fuga da vida metafórica pudesse se transformar em letras de óbito, ou seja, fugir da vida era absolutamente temporário até que nos dissessem ou provassem o contrário - mentira, se dissessem não acreditaríamos.
não sei se estou me fazendo entender
aquela vida, a noturna, é nossa outra vida, a vida que vale a pena e sobre a qual pensamos enquanto vivemos a vida secundária que envolve trabalhar estudar ou vadiar enquanto o sol bate em nossos rostos, esperando a lua aparecer para finalmente encontrar outras almas que compartilham nosso ponto de vista. talvez isso, talvez isso, mas provavelmente não.
provavelmente eu nunca vou entender
eu e você também não
porque ando pensando nisso o tempo todo
e o amor de amores e amigos me mantém por enquanto
mas quanto tempo nem eu nem você sabemos -
que deus - e eu nem acredito em deus - queira que eu não seja o próximo a ser pego na fernão dias.
e isso é tudo que quero dizer agora
sem amor nessas palavras
- o amor que me enche o coração e do qual eu poderia discorrer páginas e páginas -
sem amor nessas palavras,
só a morte,
sempre até que alguém diga ou prove o contrário - embora se dissessem não acreditaríamos.